quinta-feira, 10 de setembro de 2009

"Breve consideração sobre o tempo"

Em seu livro As confissões, Santo Agostinho indaga: “Que é, pois, o tempo?” (2004: 322) Logo, em seguida, o filósofo reflete: “Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei” (IDEM). A partir dessa proposição, Santo Agostinho nos remete também à instância do sagrado, ou seja, o tempo pode ser questionado, mas é ao mesmo tempo inefável, e apenas no plano do sagrado ele pode ser mais avivado, à medida que acolhe e alimenta aquele que pode sonhá-lo. Santo Agostinho se permite reconhecer sem receio de contestação que, se nada sobrevivesse, não haveria tempo futuro, e se o agora não existisse, o passado também não teria existido. Sendo assim, o passado e o futuro se tornam tão-somente uma referência em relação ao agora, que, por sua vez, é incessantemente desdobrado no antes e no depois, e sempre inexorável. Portanto, como explicar e apreender apenas racionalmente um conceito para esta questão: O que é, pois, o tempo?
Ao examinarmos a problemática relativa ao tempo, parece-nos que estamos diante do inapreensível. Então, por que levantar tal questão? Bastaria que nos contentássemos com os relógios. Não são estes os medidores do tempo? Todavia, há muito tempo o homem descobriu que, se os relógios lhe permitem medir alguma coisa, não é certamente o “tempo invisível”, este imensurável silêncio que nos toma inelutavelmente as vontades. Nesse sentido, é pela subjetividade que podemos ousar o alcance do tempo, e diríamos, poeticamente, torná-lo maior do que toda a eternidade.
Portanto, não é por menos que o mito do eterno retorno se propõe a narrar as origens e o desenrolar dos eventos. Basta considerarmos o verbo narrar em sua etimologia e logo estaremos diante do vocábulo grego katá, que é ponto de partida, idéia de ir a determinada direção, conforme a; egémai – conduzir, julgar, comandar como chefe; ou seja, vemo-nos diante de um verbo que é problemático por natureza, pois quem narra, recorda-se interpretando e interpreta recordando-se, o que significa que o aprendizado no plano do mito se faz com outra sensibilidade toda vez que é retomado.
A partir disso, e levando-se em conta que o mito faz referência a um lugar faltante, cabe-nos reconhecer que o tempo, enquanto discurso, é sempre uma nova elaboração de discursos identitários, cuja reflexão deve conduzir cada um à visitação ao que ficou não somente como fato ou um depósito de enunciados mortos, mas também como representação para novos enfrentamentos de seu tempo.
Por Paulo Tostes

Um comentário:

Leonardo Rosa disse...

Um clássico sobre o tempo, Santo Agostinho, eterna referência de perene sabedoria atemporal.